Lembrando das pessoas que já terminaram sua trajetória nesta vida, ou seja, os mortos, o mês de novembro nos convida a celebramos também a esperança na Ressurreição. Começamos esta reflexão sobre a morte, centrando nosso olhar sobre a Esperança, uma virtude teologal, que junto com a Fé e a Caridade, formam a tríade das virtudes que nos ligam diretamente a Deus. Deus é o Deus da Esperança. Sem a Esperança caímos no desespero, fundamento de tantos descaminhos na existência humana. Esperamos dias melhores, com os pés fincados na terra, olhamos para o céu e caminhamos construindo nosso ser em vista do último dia, isto é, da nossa morte.
Não vivemos em função da morte, mas por sermos seres finitos e limitados, inevitavelmente, passaremos por ela. Por ser algo tão fatídico em nossa experiência, muitas vezes, não damos o devido respeito para esse momento em nosso existir, evitamos assim, viver como se ela não estivesse próxima. Nos damos conta dela, quando bate a nossa porta, principalmente, quando ela ceifa alguém que nos é caro, nosso pai, nossa mãe, nosso avô, nossa avó, enfim, alguém que marca nossa vida.
O que fazer quando ela chega até nós? Quando um familiar nos deixa? Assim como nossa fé cristã tem respostas, a Psicologia também tem, principalmente, nos ensinando a trabalhar e elaborar o luto. Pois aqueles que partem antes de nós, deixam tristeza, mas também deixam a esperança, e é nessa esperança que encontrarmos forças para seguir nossa caminhada. O processo de perda tem um conceito, que não é somente da Psicologia, trata-se do conceito de Luto, que a ciência psicológica, em caso de morte, organiza em quatro momentos, ou quatro fases do luto, a saber: Negação, Revolta, Depressão e Enfrentamento ou Aceitação. Vamos tecer alguns comentários sobre cada uma delas, para ajudar o caro leitor a entender que o luto é um processo vivenciado a todo momento, pois durante todo nosso existir terreno, passamos por perdas, que necessitam sem olhadas e elaboradas. Vamos, lá:
Negação: essa é a primeira fase do processo de elaboração do luto, surge quando nos chega a notícia de que alguém próximo faleceu. Ficamos estarrecidos diante de tal informação que não sabemos como processá-la em nossa mente. Para não lidarmos diretamente com o fato, nossa razão prefere negar. A negação funciona contrariando os fatos. Mas não adianta negar, o fato ocorreu, a morte aconteceu e chegou em nossa casa. Geralmente, a negação é maior em mortes prematuras, principalmente em pais e mães que perdem seus filhos.
Revolta: essa é a segunda fase do processo, onde nossa mente procura culpados pelo acontecimento, que podem ser uma pessoa, ou em casos mais graves, culpamos Deus e nos revoltamos. É um processo normal nessa elaboração. Usamos o “porquê”. Por que minha mãe? Por que meu pai? Por que meu filho? Por que minha filha? Por que essa pessoa tão boa no deixou, se existem tantas pessoas más que poderiam partir antes dela? Aqui, temos que lembrar que a morte não conhece o conceito de justiça, chega para bons e maus. Quando encontramos pessoas em situação de revolta, não devemos julgar, pois faz parte do momento doloroso que ela está vivenciando.
Depressão: é a terceira fase da elaboração do luto. Negar não adiantou, revoltar-se não adiantou. Então, nos vem a depressão, que é uma introversão, na qual a pessoa volta-se a si mesma, vive a dor da perda, experimenta em si a finitude e a limitação humana. A vida perde o brilho, é o outono e o inverno da alma, mas necessária para a vivência do sofrimento. Entristecer-se com a perda é normal, porque agora temos de ressignificar nossa vida sem a presença física do ser amado que já não está entre nós. A Depressão no luto, prepara para a última fase do luto, conhecida como enfrentamento ou aceitação.
Enfrentamento ou aceitação: é a fase final do processo elaborativo do luto. A pessoa extroverte em seu existir a força que foi acumulada durante a introversão no processo depressivo. Toma novamente as rédeas do seu existir, e as lágrimas que antes molhavam o rosto, agora gotejam na terra, porque a pessoa se levanta e volta a caminhar, transformando a dor em semente de esperança, pois o ente falecido, continua a viver naqueles que conviveram com ele. Na aceitação a dor, paulatinamente, vai enfraquecendo, transformando-se em saudade. Sentimos saudades daqueles que amamos, mas vida continua. Como nos ensina os compositores Eri do Cais e Serginho Meriti, na canção eternizada por Zeca Pagodinho: “Deixa a vida me levar, vida leva eu! Sou feliz e agradeço, por tudo o que Deus me deu!” No enfrentamento e na aceitação deixamos a vida nos levar, mesmo com a dores da existência, a vida vale muito a pena.
Quanto Tempo dura o Luto?
Em termos psicológicos, não existe um tempo ideal para que essas fases se processem, principalmente, a fase da aceitação e enfrentamento, isso, porque cada pessoa é única e reage do seu jeito as perdas que a vida inflige. De forma geral, um ano é o tempo dessas fases. Em um ano enfrentamos datas significativas: Natal, Reveillon, Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia das Crianças, Aniversário… Cada uma dessas datas, quando vivida a experiência da perda, pela primeira vez é dolorida, pois a pessoa que amamos não estará lá, seu lugar na mesa estará vazio, mas a presença em nossa alma e em nosso coração é constante e certa. Isso nos acalenta para continuar nosso caminhar.
Minha experiência partilhada:
No último dia 26 de outubro, completou um ano da morte de minha Mãe Dona Tereza Gelchaki, estou na última fase do luto, mas confesso para vocês que a dor da ausência, dilacera a alma e o coração, mas sigo firme, porque minha mãe continua viva em mim. Esse texto, é uma forma de homenagear minha Mãe, que em todos os instantes está comigo. Obrigado por ser minha mãe.
Termino esse texto com as palavras de São Paulo Apóstolo, em sua Primeira Carta aos Coríntios, onde reforça a esperança de que com a morte não acaba tudo, pois Cristo venceu a morte e com Ele e Nele, nós também venceremos: “Ó Morte, onde está tua vitória?” (1Cor 15,55).
Texto: Professor e Psicólogo, Sérgio Gelchaki
CRP 08/31323