A capacidade de sonhar, de ter ideal, de construir utopia é das características mais preciosas de nossa condição humana. Quem vai perdendo esta capacidade vai envelhecendo sem perceber e passa a se mover num mundo de estreitos horizontes.
Para os cristãos, Jesus Cristo é aquele que mais representa o humano em sua capacidade de sonhar, de propor um ideal, uma utopia capaz de elevar a humanidade ao seu maior esplendor, à sua condição mais bela, fazendo-a resplandecer a grandeza que possui como filha do próprio Deus. E o sonho de Jesus chama-se reino de Deus.
Um dia, sentado à beira de um poço, em pleno calor do meio-dia, Jesus disse a uma mulher samaritana, que sempre vinha ali buscar água, que ele tinha a lhe oferecer uma água que a faria nunca mais sentir sede (cf. Jo 4,1-30). De fato, aquela mulher tinha buscado saciar a sua sede com sonhos pequenos, que não lhe podiam realizar. Já tivera tantos maridos e não estava feliz. Em outro episódio, Jesus chamou pescadores cujos sonhos se limitavam a lançar redes ao mar, dia após dia, a fim de obter o sustento para o viver. Disse-lhes que podia fazer deles pescadores de homens. E eles, deixando tudo, redes e barcos, entraram no sonho daquele homem que os fascinava e lhes abria um horizonte inteiramente novo. Nunca mais foram os mesmos.
Também a um homem rico Jesus propôs o sonho de Deus em troca dos bens que possuía, mas, incapaz de se desapegar, foi-se embora triste, carregando os seus próprios e pesados sonhos (cf. Mt 19,16-22). Certamente perdera a grande oportunidade de uma alegria jamais imaginada.
O mundo, em todos os tempos, sempre precisou de homens e mulheres, de jovens e crianças, de adultos e de idosos capazes de abraçar o sonho de Deus, capazes de deixar seus próprios sonhos, para se aventurar com Jesus pelos caminhos do Reino, capazes de gastar suas forças, seus talentos, sua inteligência, seus muitos ou poucos dons, sua juventude, seus anos de vida para ir além, em direção a uma utopia capaz de formar santos, de extrair do humano aquilo que tem de melhor, de produzir um amor que o mundo quase sempre desconhece.
Estamos precisando de gente que sonhe, que seja capaz de se arriscar, de se desfazer de suas amarras, de suas âncoras lançadas muitas vezes em águas muito rasas, para construir a civilização do amor, o sonho de Deus, o reino onde impera a justiça, a paz e o bem. Estamos precisando de gente que não se satisfaça em saciar a sua sede consumindo coisas e pessoas, relacionamentos fugazes, prazeres fáceis. Estamos precisando de gente para lapidar diamantes brutos a fim de que o mundo se encante novamente com o belo, o bom, o uno e o verdadeiro. Estamos precisando de casais que não pensem somente na sua família, mas sonhem que podem contribuir para que muitas famílias sejam formadas com espírito cristão, recuperadas, libertadas de suas tristezas.
Estamos precisando de jovens sonhadores, que acreditem que, com a audácia do Espírito de Jesus Cristo agindo neles, possam fazer outros jovens sonhar com o que é verdadeiro, nobre, grande, digno de ser amado; capazes de acreditar que com a força de sua juventude firmada em Deus, podem levantar jovens que estão caídos na vida, que têm precisado de doses e mais doses de algo que os anestesie para ter um pouco de felicidade, ainda que passageira. Precisamos de gente sonhadora que ouse ouvir o chamado de Jesus, que continua a convidar para segui-lo numa vida de consagração total, gastando suas vidas em cuidar das pessoas, sobretudo dos pobres e enfermos, dos pequenos e abandonados.
Precisamos de rapazes que sonhem imitar Cristo numa dedicação total, capazes de escolher entre os muitos amores possíveis, aquele amor maior que os levem a imitá-lo, se consagrando como padres em sua Igreja, mesmo que isto vá na contramão de um mundo que insiste em não mais acreditar na grandeza deste chamado.
Precisamos de bispos, padres, diáconos, religiosos e religiosas sonhadores, entregues de corpo e alma ao sonho de Cristo, à utopia do reino, alegres por viverem para ele e não para si, por gastarem suas vidas com Aquele que um dia os cativou ao seu seguimento.
Enfim, precisamos de cristãos capazes de fermentar as realidades onde atuam com o sonho do Coração de Jesus, medida única capaz de transformar a triste realidade dos nossos dias naquele sonho onde todos possam ter vida em abundância.
Texto: Dom Walter Jorge
Bispo Diocesano
Postagem: Setor de Comunicação