“Ouve, ó Israel! O Senhor teu Deus é o único Senhor. Portanto, amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e com todas as tuas forças. “ (Dt 6, 4-6)
Essa era a profissão de fé de Israel registrado no livro do Deuteronômio. A este credo Israel deveria aderir de todo o coração se quisesse ser, de fato, uma nação que agradasse a Deus. Desta adesão dependeria a sua própria felicidade, tanto quanto nação, como na vida de cada membro do povo. Mesmo em tempos de desafios muito exigentes, Israel jamais deveria deixar vacilar em seu coração esta profissão de fé com o amor exigido nela ao seu Deus, o Deus revelado a Moisés e aos profetas. Sempre que, infelizmente, isto ocorreu, o povo experimentou as tristes consequências do seu esquecimento de Deus, vendo sua esperança se esvair, e aparecer, então, a tristeza dos inúmeros males que passava a sofrer.
Certa vez, um fariseu, para tentar Jesus, lhe perguntou qual era o maior de todos os mandamentos. Era uma tentação, porque havia na Lei 248 mandamentos e 365 proibições e as escolas dos rabinos, os mestres do tempo de Jesus, discutiam muito a respeito de cada um deles para saber qual era o mandamento central e poder assim orientar a vida dos discípulos. Aquele fariseu queria saber se o rabino Jesus tinha capacidade para apontar um mandamento-síntese que apontasse uma luz naquela infinita discussão. Jesus lhe disse, então, que toda a Lei e os Profetas (portanto, o Pentateuco) se resumia no mandamento de amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Assim, Ele juntava Dt 6, 4-6 com Lv 19 …
Para os cristãos não há mais dúvida, portanto, daquilo que é central em nossa fé. Amar a Deus de todo o nosso coração e ao próximo como a nós mesmos é a chave para nossa vida e o passaporte para a vida eterna. E foi isso que Jesus fez ao longo de toda a sua vida. Ele amou ao Pai de todo o seu coração, com toda a sua alma e com toda as suas forças, e amou as pessoas até ao ponto de morrer por elas. Ele não só ensinou com as palavras, mas viveu o que ensinou no seu grau máximo.
O mundo de hoje tem carecido de referências que norteiem a vida dos seus habitantes de forma a lhes dar segurança, de lhes conferir esperança e alegria de viver. Não é difícil constatar como a vida está banalizada, seja por meio da violência que ceifa a vida de milhares, muitas vezes por razões banais, seja pela desilusão de muitos, que já não encontram alegria de viver, se lançando em qualquer tipo de aventura que lhes traga alegria, ainda que passageira, e muitas vezes a um preço alto. Isso, sem falar, daqueles que fazem das riquezas a razão de sua vida, não importando em acumular muito além do que lhe seria necessário, ainda que custe a miséria de milhões e a destruição do Planeta Terra.
No ensinamento de Jesus está a referência que precisamos. Em amar a Deus de todo o nosso coração, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças, e amar ao próximo como a nós mesmos está a nossa vida, a nossa esperança de futuro, a alegria que não podemos encontrar em nada mais, por mais que a propaganda seja reluzente. Este mandamento tão simples e ao mesmo tempo tão exigente, faz-nos sair de nós mesmos, de nossa autorreferencialidade, evitando que nos tornemos o centro de nós mesmos, rompendo com a cultura do individualismo hoje reinante e que tanto mal tem feito ao mundo e a cada um de nós. Tal cultura tem levado as pessoas a não quererem mais se comprometer com nada que não lhes diga respeito, esquecendo as causas belas, altruístas e necessárias. Fica-se tão absorvido com o cuidado de si mesmo e das coisas privadas, que o tempo é todo gasto em cuidar de si, no máximo de sua família, esquecendo a família grande que é a comunidade, a humanidade e o mundo, sem os quais não há futuro para as famílias nucleares.
Só quando Deus se tornar o Absoluto único da vida de todas as pessoas é que cessarão as guerras que ferem os povos, as misérias que matam milhões, a necessidade fremente de consumir para se sentir feliz, a falta de fraternidade que insensibiliza para a dor alheia e tantos outros males. Só quando o amor a Deus for o centro de nossas vidas, amaremos uns aos outros privando o mundo destas muitas formas de mortes e assegurando um futuro para a vida sobre a Terra.
Texto de: Dom Walter Jorge
Bispo Diocesano