A Palavra de Deus exorta a todos os que creem em Jesus a se alegrar sempre nele (cf. Fl 4,4), bem como a rejeitar a tristeza como condição de vida (cf. Sl 42,11). É que Deus, como nosso Criador, sabe que se nos entregarmos à tristeza, poderemos facilmente passar a viver permanentemente na companhia dela, arruinando a nossa vida e fazendo sofrer as pessoas que convivem conosco.
O fato é que a tristeza pode se tornar uma espécie de vício, o qual, apesar de fazer a pessoa sofrer, também faz com que a mesma acabe por viver nele todos os dias. É como se fosse uma trilha criada pela mente, um caminho gravado por ela, com qual o cérebro vai ficando tão acostumado que já não consegue ou não deseja mais “andar” por outros caminhos, que lhe parecem, então, muito exigentes. Ela acaba por fazer da tristeza um modo de vida, recusando-se a ser consolada, pois acredita que ninguém, nem mesmo Deus, será capaz disto.
…ninguém deveria pensar ser possível superar a tristeza sem a contribuição fundamental da espiritualidade.
Mas, ninguém nasceu para ser triste e, embora todos nós, mais cedo ou mais tarde, tenhamos que enfrentar períodos de tristezas, e, às vezes, até depressões, todas as pessoas têm a capacidade humana de vencer a tristeza. Assim como somos capazes de tristeza, somos também capazes de alegria, pois isto é dádiva que o Senhor nos deu para que a tristeza em nós não se torne mortal (cf. Ecl 11,10).
Sabemos que a nossa condição humana é constituída por três dimensões: o espírito, a alma (mente) e o corpo (cf. 1Ts 5,23) e, que, tudo o que deveremos enfrentar em nossa vida afetará estas três dimensões, pois são inseparáveis uma da outra. Assim, a tristeza, sobre a qual estamos aqui tratando, deverá ser enfrentada com o espírito, com a alma e com o corpo.
Vencer a tristeza com a ajuda do corpo significa recorrer a tudo aquilo que o corpo possibilita para amenizar os impactos dela, tais como exercícios físicos, alimentação equilibrada e outros mais, os quais contribuirão para se ter um organismo mais saudável e capaz de produzir os hormônios do bem-estar como serotonina, endorfinas e outros mais. Já, lançar mão dos recursos ligados à mente para vencer estados de tristeza, significa procurar caminhos de bem-estar mental e até, se preciso for lançar mão da psicologia ou da psicanálise e da psiquiatria, pois há certos “nós” produzidos pela mente que não conseguimos desfazer sozinhos, sendo preciso a ajuda de especialistas e, por vezes, até de certos medicamentos.
Do mesmo modo, e acima de tudo, ninguém deveria pensar ser possível superar a tristeza sem a contribuição fundamental da espiritualidade. Há pessoas que recorrem a todo tipo de ajuda para o corpo e a mente, mas não cuidam do espírito, o qual é também afetado por nossos sofrimentos. Deste modo, as causas mais profundas de certas tristezas não são tratadas de modo adequado, podendo permanecer instaladas na pessoa.
A espiritualidade cristã considera que muitas tristezas permanecem devido às condições espirituais frágeis da pessoa, tais como uma fraca confiança em Deus ou uma fé que permanece infantil, esperando tudo de um deus mágico, que existe apenas para resolver problemas. Também ensina que o pecado possui uma grande capacidade de adoecer o nosso espírito e que o seu tratamento requer conversão, caminho que só é possível trilhar com o confronto da nossa vida com a Palavra de Deus. Muitas vezes a pessoa fica adiando a necessária conversão, nunca se decidindo pela “porta estreita” do enfrentamento cristão e adulto de sua cruz, preferindo andar pelo caminho largo de uma religiosidade sempre superficial e de um deus sempre adequado aos seus desejos. Enquanto insistir em viver do seu modo, ela continuará sem resolver a fundo as causas de suas frustrações, pois só o Deus que nos criou conhece profundamente o que é melhor para nós.
Somente por meio de uma obediência confiante à sua Palavra é que poderemos de fato alcançar a verdade que nos liberta e que tem o poder de nos fazer felizes. Só assim é que seremos arrancados decididamente da tristeza e da amargura, sem precisar viver atrás de fugas, que nunca as resolvem e as curam de fato. É que Deus nos ama com amor eterno, e embora compreenda a nossa tristeza, não deseja que vivamos nela por muito tempo, pois sabe do seu poder destruidor.
Seu desejo, ao contrário, é nos dar vida em abundância, vida em plenitude, vida alegre e feliz.
Texto de : Dom Walter Jorge
Bispo da Diocese de União da Vitória – PR